X

Whatsapp Chat

Cannabis com fins medicinais e o tratamento da Esclerose Múltipla

Você sabia que mais de 2,3 milhões de pessoas têm Esclerose Múltipla (EM) no mundo? No Brasil, a Abem (Associação Brasileira de Esclerose Múltipla) estima que a doença afeta mais de 40 mil pacientes. Neste texto vamos mostrar dados e estudos que estão sendo desenvolvidos e aplicados com o uso medicinal da Cannabis relacionado com a EM.

O que é a Esclerose Múltipla?

É uma doença degenerativa e neuro-inflamatória crônica e autoimune, ou seja, as células de defesa do organismo deixam de reconhecer determinadas células do Sistema Nervoso como próprias daquele organismo, passam a vê-las como “intrusas” e acionam o Sistema Imunológico para destruí-las, o que leva à ocorrência de lesões cerebrais e medulares.

Como o organismo “rebate” essas agressões, responde com a reestruturação celular que novamente se vê sob o “ataque” imunológico e assim, está iniciado o ciclo de sintomas que vem e vão. Os pacientes frequentemente relatam que estão bem e animados para as tarefas diárias em uma semana, enquanto, em outros dias, mal conseguem sair da cama. Há, basicamente, três tipos da doença descritos na literatura médica, considerando a sua evolução e severidade dos sintomas.

Os sintomas

A esclerose múltipla é uma doença heterogênea, podendo ocasionar diversos sintomas neurológicos dependendo da área do sistema nervoso atingida. Não existe uma manifestação neurológica típica, porém alterações visuais, fraqueza nos membros, desequilíbrio, descoordenação, alterações de sensibilidade e distúrbios urinários são as queixas comuns.

A espasticidade e os espasmos podem ser sintomas importantes da EM que faz com que, no primeiro caso, os músculos se sintam rígidos, pesados ​​e difíceis de se mover, enquanto, no segundo, há um endurecimento repentino de um músculo.

Alguns dos sintomas mais frequentes são:

  • Fadiga intensa que começa no início da manhã ou vem de repente e piora;
  • Fraqueza nas pernas e nos pés que dificulta a caminhada;
  • Entorpecimento ou formigamento nos braços, pernas ou face;
  • Rigidez e espasmos musculares;
  • Visão dupla ou turva ou movimentos oculares rápidos;
  • Tonturas e problemas de equilíbrio dentre outros.

Monitorar e anotar esses sintomas, assim como os medicamentos que utilizou, se ajudaram no controle, qual foi a rotina daquele dia, são práticas recomendadas para seguir um determinado padrão da doença.

Cannabis com fins medicinais

Lembro a vocês que os fitocanabinoides (extratos de Cannabis) ou medicamentos à base de Cannabis atuam em receptores (proteínas encontradas nas células), nos quais, a associação gera múltiplos sinais em todo o corpo. Esses sinais são revertidos em equilíbrio nas funções celulares. A literatura científica mostra que a combinação de canabinoides (Canabidiol – CBD e Tetraidrocanabinol – THC) é a melhor fórmula testada para aliviar os sintomas e reduzir a neuro-inflamação em experimentos com animais.

Quando passamos para as pesquisas clínicas (estudos em seres humanos), a comprovação positiva do uso de CBD+THC é vista em, basicamente, parte dos resultados. No entanto, a combinação ainda é vantajosa, segundo os autores, pois se deve ao fato de os compostos agirem sob efeito sinérgico. Enquanto o CBD reduz a quantidade de citocinas pró-inflamatórias, o THC parece ser mais eficaz na redução da espasticidade.

 

Pesquisas recentes mostram que os Canabinoides podem ser eficazes na redução da dor neuropática que muitos pacientes com EM enfrentam.

 

O que mostram os estudos

Em uma pesquisa com 28 pacientes portadores da doença com dor neuropática foi utilizado o medicamento Sativex (ou Mevatyl, spray indicado para o alívio da rigidez muscular associada à EM com 1:1 CBD:THC).

74% dos participantes responderam ao medicamento através de um escore de dor neuropática.

Em outra pesquisa realizada com 393 portadores de EM, duplo-cego, grupos paralelos, controlado por placebo, parte dos indivíduos utilizou Sativex (Mevatyl) com uma média de 8,8 jatos do spray/dia e outra parte utilizou um spray inerte.

-50% dos pacientes do grupo Sativex apresentaram redução de 30% nos escores de dor, enquanto 45% dos pacientes do grupo controle apresentaram redução semelhante.

O medicamento Dronabinol também chegou a ser testado em portadores de EM em diferentes doses em relação ao grupo placebo e também, assim como o Sativex, se mostrou uma droga segura em tratamentos a longo prazo para reduzir a dor neuropática. O Dronabidiol é indicado para a dor neuropática na EM devido aos seus efeitos analgésico, sedativo, espasmolítico, antinflamatório e ansiolítico, todos contribuindo para a melhora da qualidade de vida.

A disfunção cognitiva (percepção, atenção, memória e raciocínio) pode afetar até 80% dos portadores de EM e pode gerar efeitos colaterais como dificuldades em relacionamentos, com a família, manutenção de um emprego, o que acarreta queda na qualidade de vida. Uma pergunta que surge é se o uso de produtos/medicamentos de Cannabis pode exacerbar essa condição. As publicações científicas, embora sejam poucas nesse quesito, mostram que não há efeitos psicotomiméticos (alterações psicóticas), sobre o humor ou nas condições cognitivas.

 

adriana-mslEscrito por Dra. Adriana Grosso

Medical Science Liaison, MSL, na HempMeds Brasil.

 

 


Estudos consultados:

  1. O que é Esclerose Múltipla (EM) – ABEM | Associação Brasileira de Esclerose Múltipla
  2. Jones É, Vlachou S. A Critical Review of the Role of the Cannabinoid Compounds Δ9-Tetrahydrocannabinol (Δ9-THC) and Cannabidiol (CBD) and their Combination in Multiple Sclerosis Treatment. 2020 Oct 25;25(21):4930. doi: 10.3390/molecules25214930. PMID: 33113776; PMCID: PMC7663366.
  3. Bruni, N.; Della Pepa, C.; Oliaro-Bosso, S.; Pessione, E.; Gastaldi, D.; Dosio, F. Cannabinoid Delivery Systems for Pain and Inflammation Treatment. Molecules 2018, 23, 2478.
  4. Vlachou, S.; Panagis, G. Regulation of brain reward by the endocannabinoid system: A critical review of behavioral studies in animals. Pharm. Des. 2014, 20, 2072–2088.
  5. A Losseff, N.; Webb, S.L.; I O’Riordan, J.; Page, R.; Wang, L.; Barker, G.J.; Tofts, P.S.; I McDonald, W.; Miller, D.H.; Thompson, A.J. Spinal cord atrophy and disability in multiple sclerosis. A new reproducible and sensitive MRI method with potential to monitor disease progression. Brain 1996, 119, 701–708.
  6. Hilliard, A.; Stott, C.; Wright, S.; Guy, G.; Pryce, G.; Al-Izki, S.; Bolton, C.; Giovannoni, G. Evaluation of the Effects of Sativex (THC BDS: CBD BDS) on Inhibition of Spasticity in a Chronic Relapsing Experimental Allergic Autoimmune Encephalomyelitis: A Model of Multiple Sclerosis. ISRN Neurol. 2012, 2012, 1–7.
  7. Moreno-Martet, M.; Feliú, A.; Espejo-Porras, F.; Mecha, M.; Carrillo-Salinas, F.J.; Fernández-Ruiz, J.; Guaza, C.; De Lago, E. The disease-modifying effects of a Sativex-like combination of phytocannabinoids in mice with experimental autoimmune encephalomyelitis are preferentially due to ∆ 9 -tetrahydrocannabinol acting through CB1 receptors. Scler. Relat. Disord. 2015, 4, 505–511.
  8. Al-Ghezi, Z.Z.; Busbee, P.B.; Alghetaa, H.; Nagarkatti, P.; Nagarkatti, M. Combination of cannabinoids, delta-9-tetrahydrocannabinol (THC) and cannabidiol (CBD), mitigates experimental autoimmune encephalomyelitis (EAE) by altering the gut microbiome. Brain Behav. Immun. 2019, 82, 25–35.
  9. Turri, M.; Teatini, F.; Donato, F.; Zanette, G.; Tugnoli, V.; Deotto, L.; Bonetti, B.; Squintani, G. Pain Modulation after Oromucosal Cannabinoid Spray (SATIVEX®) in Patients with Multiple Sclerosis: A Study with Quantitative Sensory Testing and Laser-Evoked Potentials. Medicine 2018, 5, 59.