O isolamento social vem sendo a recomendação primordial das autoridades de saúde no Brasil e no mundo a fim de evitar a propagação do coronavírus. A medida, no entanto, impõe a todos uma mudança mais do que radical no estilo de vida, com impossibilidade de contato físico e o medo de ser contaminado.
Tenho certeza que essa situação é nova para você, caro leitor, como é para mim e para todas as pessoas. Muitos estão tendo dificuldades de lidar com um momento tão limitante e de incertezas e, somado a uma pré-disposição a transtornos de ordem psicológica e/ou psiquiátrica, não é de se espantar que a saúde mental dessas pessoas fique vulnerável.
Basta dar uma espiadinha nas notícias e você vai se deparar com uma infinidade de matérias que trazem informações como essas:
“Casos de depressão quase dobraram e os de ansiedade e estresse tiveram um aumento de 80%.”
“O isolamento social impôs às pessoas uma mudança radical no estilo de vida. Somando-se ao medo de ser contaminado, à impossibilidade do contato físico, entre outros fatores, a situação acaba trazendo transtornos também à saúde mental da população.”
“No atual período de isolamento social causado pela pandemia de COVID-19, não é de se espantar que a saúde mental das pessoas fique mais vulnerável.”
“Os problemas de saúde mental estão aumentando durante a pandemia causada pelo novo coronavírus e o isolamento social forçado, segundo estudo da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ).”
Segundo o médico psiquiatra Jair de Jesus Mari, professor titular e chefe do Departamento de Psiquiatria da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (EPM/Unifesp), a primeira reação é de estresse agudo relacionado à pandemia que ocasiona uma circunstância súbita e inesperada – mudança radical do estilo de vida. O foco de apreensão é o medo de ser contaminado, semelhante a outras situações traumáticas como um desabamento ou terremoto. A epidemia é, portanto, um forte fator de estresse que leva a desequilíbrios neurofisiológicos e, segundo o Dr. Jair, os profissionais de saúde são os mais vulneráveis pelo maior risco de contaminação.
A persistência e o prolongamento destes desequilíbrios neuroquímicos, hormonais e inflamatórios podem desencadear um transtorno mental mais grave.
A segunda reação está relacionada ao confinamento compulsório que exige uma forçada mudança de rotina, quando são comuns as manifestações de desamparo, tédio e raiva pela restrição da liberdade. É uma reação de ajustamento situacional caracterizado por ansiedade, irritabilidade e desconforto em relação à nova realidade. Essas reações são esperadas e preocupantes, do ponto de vista da saúde mental, quando impedem as atividades diárias da pessoa. As possíveis perdas econômicas e afetivas decorrentes da epidemia desencadeiam a terceira reação, gerando experiências traumáticas intensas. A experiência deixará sequelas, sendo as mais importantes a depressão, o risco de suicídio e o desenvolvimento posterior do estresse pós-traumático.
Cannabis medicinal na saúde mental
Estudos científicos mostraram que o canabidiol (CBD) é um grande aliado no controle dos transtornos do estresse que geram ansiedade, depressão, pânico, Transtorno Obsessivo Compulsivo (TOC) e outras formas de transtornos de humor e traumas. O CBD é capaz de induzir alterações neuroplásticas nas sinapses serotoninérgicas do córtex pré-frontal e hipocampo cerebrais, áreas relacionadas ao controle de humor e bem-estar.
O CBD demonstrou potencial terapêutico como antipsicótico, ansiolítico e antidepressivo e em diversas outras condições neuropsiquiátricas, associado a pequenas doses de Δ9-tetraidrocanabinol (THC).
A HempMeds Brasil quis saber o quanto esse período de pandemia e isolamento social estava afetando as pessoas em sua saúde mental e o quanto isso repercutia na procura por uma consulta médica e pelo uso de Cannabis medicinal. Três questões foram feitas aos prescritores de Cannabis medicinal. Confira as respostas a seguir.
Pesquisa com médicos prescritores de cannabis
Para cada resposta, foi solicitado que considerassem o período de 25/03/2020 até 14/05/2020. Um questionário foi enviado digitalmente para médicos prescritores de todos os estados brasileiros. A participação foi voluntária, as informações obtidas foram utilizadas somente como dados numéricos, sem a identificação dos participantes. É importante destacar que a intenção aqui era apenas levantar dados simples de frequência.
Foram obtidas 31 respostas, sendo que 64,5% delas partiram do estado de São Paulo e 6,5%, igualmente, foram dadas por médicos dos estados do Rio de Janeiro e Sergipe. Psiquiatras e clínicos gerais igualaram-se na porcentagem de respostas dadas (22,6% cada especialidade), seguidos por neurologistas (16,1%).
Do total de participantes, 35,5% dos prescritores disseram ter atendido de 6 a 10 pacientes descrevendo sintomas de ansiedade, depressão ou pânico em decorrência do isolamento social, seguidos por 29% relatando atendimento entre 0 a 5 pacientes no período correspondente. Interessante notar que uma parcela de médicos participantes, aproximadamente 13%, chegou a atender uma quantidade de 11 a 15 indivíduos, 6,5% atendeu de 16 a 20 e também de 21 a 25 pacientes e 9,7% chegaram a ser procurados por mais que 31 pacientes descrevendo sintomas de transtorno de ansiedade, depressão ou pânico.
Dentro dos transtornos citados, a maior parte dos participantes, 87,1% dos médicos optaram pela prescrição de produtos de Cannabis para propósitos medicinais para até 5 pacientes, enquanto 12,9% chegaram a prescrever para um intervalo maior de 6 a 10 pacientes.
Um total de 93,5% dos médicos relatou que uma quantidade entre 0 a 5 pacientes já utilizavam produtos de Cannabis para fins medicinais para outra doença surgida antes do evento da pandemia de COVID-19 e os procuraram para tratar ansiedade, depressão ou pânico desenvolvidos recentemente.
Dois médicos (6,5%) afirmaram que 6 a 10 pacientes em uso de Cannabis medicinal os procuraram para relatar novos sintomas de transtornos de estresse e ansiedade.
Conclusões da pesquisa
Embora o levantamento não tenha alcançado uma amostra significativa, ainda assim os resultados indicam tendências interessantes.
Realmente, a epidemia é um forte fator de estresse que leva a desequilíbrios na saúde mental visto pela quantidade de pacientes à procura de tratamento para sintomas de transtorno de ansiedade, depressão ou pânico.
Desses pacientes, uma parcela passou a utilizar produtos de Cannabis com propósitos medicinais como opção terapêutica, o que mostra a confiança do prescritor nas propriedades e ações do produto, um dos aliados no combate a toda essa ansiedade que a pandemia está trazendo. Você vai me dizer que há medicamentos alopáticos já prescritos há anos que tratam as mesmas condições. Sim, e provavelmente os prescritores os indicaram. Veja que da quantidade de pacientes que procuraram os médicos com sintomas depressivos e de ansiedade (figura 1), uma parcela (0 a 5 e 6 a 10) recebeu os produtos de Cannabis com fins medicinais (figura 2), o que pode demonstrar indicação consciente e mais assertiva para determinados casos.
E, por fim, poucos foram os pacientes já usuários de Cannabis medicinal, devido à outras patologias, que retornaram aos seus médicos para tratar transtornos à saúde mental.
Sendo assim, se você tinha alguma dúvida que os produtos de Cannabis medicinal pudessem ser úteis como ferramentas terapêuticas atuando de forma a trazer o seu organismo para o funcionamento harmônico (a um estado de homeostase ou equilíbrio, como dizem os especialistas), espero tê-lo convencido com essa breve e simples pesquisa que há alternativas seguras e confiáveis para o conforto emocional em tempos de isolamento social.
Leia também:
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Coronavírus: contextualização e cuidados
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O sistema endocanabinoide e a comunicação intercelular
Escrito por Dra. Adriana Grosso
Medical Science Liaison, MSL, na HempMeds Brasil.
Referências:
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- https://tab.uol.com.br/noticias/redacao/2020/03/15/como-lidar-com-ansiedade-e-depressao-em-tempos-de-coronavirus.htm
- https://www.uol.com.br/vivabem/noticias/redacao/2020/04/02/quarentena-e-saude-mental-depressao-tdah-e-outros-quadros-pedem-cuidados.htm
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